segunda-feira, fevereiro 28, 2005

Importância da etimologia

Nuno Crato escreve esta semana na Única (Expresso) um artigo, Cálculos e Hipérboles, onde demonstra a importância da etimologia para perceber a utilização das mesmas palavras em realidades (aparentemente) distintas. Transcrevo aqui apenas a 1ª parte do artigo:

A partir de certa idade, um problema de saúde muito comum é a acumulação de resíduos sólidos nos rins. São os chamados cálculos, pequenas pedras que podem atingir alguns centímetros e tornar-se problemáticas. O nome é curioso. Terá alguma coisa a ver com o cálculo aritmético?
A etimologia das palavras é comum. Provêm ambas do grego
khalix, por via do latim calculus, que significava exactamente pedra. Só que pedra em latim era também peça de cálculo. Contava-se com pedrinhas - com «cálculos» - e dizia-se pois que se calculava. Daí deriva o uso da palavra «cálculo» para designar contagem ou computação.
Curiosamente, esta última palavra deriva também do latim. A forma erudita para contar era
computare - a palavra calculare chegou-nos por via plebeia. No século XX, a forma erudita generalizou-se por influência directa da expressão inglesa para computador. Fenómeno semelhante se registou com muitas outras palavras: o português, o francês e outras línguas de origem latina apropriaram termos do latim vulgar, enquanto o inglês apropriou depois termos equivalentes de formas eruditas.
A história da terminologia matemática está repleta de étimos que se bifurcaram em termos aparentemente não relacionados. Há o anel algébrico e há o anel que se coloca nos dedos. Há a aplicação injectiva, que é um nome dado a uma função matemática biunívoca, e há a injecção de um medicamento. Há o integral de uma função e há o pão integral.